segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Haiti: subdesenvolvimento e genocídio




Há alguns meses, em 26 de julho de 2010, Lucius Walker, líder da organização norte-americana Pastores pela Paz, em um encontro com intelectuais e artistas cubanos, me perguntou qual seria a solução para os problemas de Haiti.

Sem perder um segundo sequer, respondi-lhe: "No mundo atual não há solução, Lucius; mas no futuro do qual estou falando, sim. Os Estados Unidos são um grande produtor de alimentos, podem abastecer a dois bilhões de pessoas e têm a capacidade para construir casas que resistam aos terremotos; o problema é a forma em que se distribuem os recursos. Ao território de Haiti há que lhe restituir outra vez até mesmo os bosques; e no entanto, não há solução na ordem atual do mundo."

Lucius referia-se aos problemas desse país montanhoso, superpopulado, desprovido de árvores, de gás para cozinhar, de comunicações e indústrias, com um elevado grau de analfabetismo, doenças como o HIV, e ainda ocupado pelas tropas das Nações Unidas.

"Quando essas circunstâncias mudarem ", lhe acrescentei, "vocês mesmos, Lucius, poderão levar alimentos dos Estados Unidos ao Haiti." O nobre e humanitário líder de Pastores pela Paz faleceu um mês e meio depois, em 7 de setembro, à idade de 80 anos, legando a semente de seu exemplo a muitos norte-americanos.

Não tinha aparecido ainda uma tragédia adicional: a epidemia do cólera, que em 25 de outubro reportou mais de 3 000 casos. À tão dura calamidade soma-se que em 5 de novembro um furacão açoitou seu território, causando inundações e o transbordamento dos rios.

Este conjunto de dramáticas circunstâncias merece que lhes dediquemos a devida atenção.

O cólera apareceu pela primeira vez na história moderna em 1817, ano em que se produziu uma das grandes pandemias que açoitaram a humanidade no século XIX, que causou grande mortalidade principalmente na Índia. Em 1826 a epidemia reincidiu, invadindo a Europa, passando por Moscou, Berlim e Londres, e se estendendo ao nosso hemisfério de 1832 a 1839. Em 1846 desata-se uma nova epidemia mais feroz ainda, que golpeou três continentes: Ásia, África, e América. Ao longo do século, epidemias que afetavam as três regiões foram se repetindo. No entanto, em decorrência de mais de 100 anos, período que compreende quase todo o século XX, os países da América Latina e do Caribe se viram livres desta doença, até a data de 27 de janeiro de 1991, quando apareceu no porto de Chancay, ao norte de Peru, que primeiro se estendeu pela costa do Pacífico e depois pelas do Atlântico, e a 16 países; 650 mil pessoas adoeceram em um período de 6 anos.

Sem dúvida alguma, a epidemia afeta bem mais aos países pobres, em cujas cidades se aglomeram bairros populosos que muitas vezes carecem de água potável, e as águas albanais, que são portadoras do vibrião colérico causante da doença, se misturam com aquelas.

No caso especial do Haiti, o terremoto desfez as redes de uma e outra onde estas existiam, e milhões de pessoas vivem em casas de campanha que muitas vezes carecem inclusive de latrinas, e tudo se mistura.

A epidemia que afetou nosso hemisfério em 1991 foi o vibrião colérico 01, biotipo "Tor", serotipo Ogawa, exatamente o mesmo que penetrou por Peru naquele ano.

Jon K. Andrus, Diretor Anexo da Organização Panamericana da Saúde, informou que a bactéria presente no Haiti era precisamente essa. Disso se derivam uma série de circunstâncias a tomar em conta, que no momento oportuno determinarão importantes considerações.

Como se conhece, nosso país vem formando excelentes médicos haitianos e prestando serviços de saúde nesse fraterno país desde há muitos anos. Existiam problemas nesse campo muito sérios e avançava-se ano por ano. Ninguém podia imaginar, por não existirem antecedentes, que se produzisse um terremoto que matou a mais de 250 mil pessoas e ocasionou inúmeros feridos e lesionados. Em frente a esse golpe inesperado, nossos médicos internacionalistas redobraram seus esforços e consagraram-se a seu trabalho sem descanso.

No meio do duro desastre natural, há menos de um mês se desatou a epidemia de cólera com grande força; e como já expressamos, em tais circunstâncias desfavoráveis se apresentou o furacão.

Ante a gravidade da situação, a Subsecretaria Geral das Nações Unidas para Assuntos Humanitários, Valerie Amos, declarou ontem que precisavam de 350 médicos e 2 000 enfermeiras mais para fazer frente à doença.

A servidora pública chamou a estender a ajuda para além de Porto Príncipe, e revelou que os fornecimentos de sabão e de água limpa só chegam a 10 por cento das famílias instaladas da capital, sem assinalar a quantos chegavam nessa cidade.

Diversos servidores públicos das Nações Unidas lamentaram nos últimos dias que a resposta da comunidade internacional ao pedido de ajuda feito para enfrentar a situação não chegasse ao 10% dos 164 milhões de dólares solicitados com urgência.

"Amos reclamou uma reação rápida e urgente para evitar a morte a mais seres humanos por causa do cólera", informou uma agência de notícias.

Outra agência comunicou hoje que a cifra de haitianos mortos se eleva já a "1 523 pessoas, 66 mil 593 têm sido atendidas, e mais de um milhão de habitantes seguem dormindo nas praças públicas".

Quase 40% dos doentes têm sido atendidos pelos integrantes da Brigada Médica Cubana, que conta com 965 médicos, enfermeiros e técnicos que têm conseguido reduzir o número de mortes a menos de 1 por cada 100. Com esse nível de atenção o número de baixas não atingiria a cifra de 700. As pessoas falecidas, como norma, estavam extremamente debilitadas por desnutrição ou causas similares. Os meninos detectados a tempo, quase falecem.

É de suma importância evitar que a epidemia se estenda a outros países da América Latina e o Caribe, porque nas atuais circunstâncias causaria um dano extraordinário às nações deste hemisfério.

Impõe-se a necessidade de buscar soluções eficientes e rápidas à luta contra essa epidemia.

Hoje tomou-se a decisão pelo Partido e pelo Governo de reforçar a Brigada Médica Cubana no Haiti com um contingente da Brigada "Henry Reeve", composto por 300 médicos, enfermeiras e técnicos da saúde, que somariam mais de 1 200 colaboradores.

Raúl estava visitando outras regiões do país, e informado em detalhe de tudo.

O povo de Cuba, o Partido, e o Governo, uma vez mais estarão à altura de sua gloriosa e heroica história.

Fidel Castro Ruz

26 de Novembro de 2010 

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